quarta-feira, 30 de março de 2011

POESIA VISUAL



Uma animação fantástica.


Fui procurar letras e encontrei poesia. Curiosamente, parece que esta coisa de transmitir emoções através de composições tipográficas não foi inventada pelo Design :)... deixo aqui alguns exemplos que me deliciaram, espero que gostem.


 


Altar é o nome desta composição de Porfyrius Optatianus, que remonta ao ano 325 d.C. (século IV) !!!





                                                               
Aqui, uma outra composição, esta de Venantius Honorius Clementianus Fortunat ou Venance Fortunat, nascido cerca de  530 em Valdobbiadene. Morreu no ano de 609, em Poitiers, França. Poeta cristão do século VI.















Robert Angot
Um poema visual, muito bem ilustrado com o próprio texto, de um poeta do século XVI.









Vladmir Maiakóvsky experimentou fazer poesia relacionando-a com as artes plásticas de seu tempo, como membro do movimento construtivista russo, paralelo ao futurismo italiano. O letrismo, as composições geometrizantes e as colagens estavam na moda, num grupo de artistas revolucionários que eram pintores, escultores, cineastas, teatrólogos, dedicados a todo o tipo de arte pública, em espaços abertos, fora da tradição burguesa. A sua queda para as vanguardas e expressões visuais vem da infância... Exemplo é esta carta giratória, espiralada, escrita aos 12 anos, em 1915.






E. M. de Melo e Castro é um nome consagrado na poesia visual e experimental, em Portugal e no Brasil onde já publicou uma série considerável de títulos tanto de poemas como de teoria e crítica literárias.














 Poegoespaço de Da Nirham Eros




















Ronaldo Azeredo é um poeta concreto que não escreveu versos. Muito jovem alinhou-se ao Concretismo e criou  peças emblemáticas. Pela simplicidade de construção, estes poemas tornaram-se conhecidos e serviram até como uma espécie de modelo para a identificação dos procedimentos concretistas de modo geral: o poema como mera representação gráfica de uma idéia abstrata ("velocidade") ou de um fenômeno natural, etc.







 



Vicente de Paulo Siqueira, mora em Brasília, e é também poeta visual.







No poema acima, de Ardengo Soffici, há pequenos versos que se confundem com a explosão de tipos e sinais gráficos, a dar a ideia de simultaneidade da comunicação.



Ana Cláudia Gruszynski é gaúcha e  professora de Comunicação na UFRGS (Rio Grande do Sul)

Adorei este poema.












Magníficas criações tipográficas de Heb Lubalin. Os franceses classificam-no na categoria da "typoésie"", uma espécie de poesia tipográfica, segundo Jérôme Peignot. Uma denominação que revela o aspecto visual da escrita pela composição tipográfica.
De fato, no primeiro caso ele cria uma imagem sugestiva que não pode ser considerada um ideograma, embora use o engenhoso recurso de incluir "child" (criança, bebê) e "&" no interior da letra"O" para compor um discurso transformado em figuração.

Em baixo, uma jóia tipográfica e sugestiva, chamada "Families". As letras "i" e "l" "visualizam três "pessoas", de diferentes tamanhos (de letras) sugerindo mãe, pai e filho(a).



Espero que gostem desta selecção.


OS POETAS

Os poetas são os designers da literatura. Ninguém como um poeta, um grande poeta, consegue manipular as palavras, depurando-as, até transmitir a essência das emoções.
E Fernando Pessoa é o mestre nesta matéria. Ultrapassando-se a si próprio ao recriar-se nos diversos heterónimos, brincando com a angústia de pensar demais, amar demais e sofrer demais, que é assim que todos os grandes poetas sentem.
Para a segunda proposta de trabalho vamos ter que realizar um trabalho tipográfico tendo como como ponto de partida extractos de poemas de três heterónimos de Fernando Pessoa.
Por sugestão do professor fiz pesquisa sobre os "poetas" do poeta, Ricardo Reis, Alberto Caeiro e Álvaro de Campos e procurei resumir adjectivos e substantivos que se possam associar a cada uma destas criações.

Eis o que retirei dessas leituras:
Ricardo Reis :   
            

Discípulo de Caeiro               "Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira rio -
Classicismo                                        Pagã  triste e com flores no regaço"
Calma
Estoicismo
Indolência
Apatia
Culto do belo
Latinismo
Elegância
Ritmo

Álvaro de Campos
Decadentismo                                " Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!  
Simbolismo                       Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!" 
Futurismo
Confusão
Desiquilíbrio
Intensidade
Ruptura
Transgressão
Dor
Alberto Caeiro:
Sentimento/pensamento
Natureza                                  "Tristes das almas humanas, que põem tudo em ordem,
Pureza                                        Que traçam linhas de cousa a cousa,
Harmonia                                   Que põem letreiros com nomes nas árvores absolutamente reais,   
 Inocência                                  E desenham paralelos de latitude e longitude
Simplicidade                              Sobre a própria terra inocente e mais verde e florida do que isso!
Ruralidade
Atemporalidade
Bucolismo


Esta é a matéria-prima com que vamos trabalhar.

terça-feira, 29 de março de 2011

TIPOGRAFIA II

 
Tipografia - a arte da composição
A palavra tipografia tem origem no idioma grego que significa "typos’, em português denominado "forma" e "graphein" traduzido como "escrita"), sendo definida como a arte e o processo de criação na composição de um texto, física ou digitalmente. Assim como no design gráfico em geral, o objetivo principal da tipografia é dar ordem estrutural e forma à comunicação impressa.

Na maioria dos casos, uma composição tipográfica deve ser especialmente legível e visualmente envolvente, sem desconsiderar o contexto em que é lido e os objetivos da sua publicação. Em trabalhos de design gráfico experimental (ou de vanguarda) os objetivos formais extrapolam a funcionalidade do texto, portanto questões como legibilidade, nesses casos podem não ser consideradas de grande relevância.

A arte tipográfica incorporou valores estéticos no decorrer dos séculos. Obviamente, o patrimônio cultural da humanidade preservado por meio da escrita não está restrito ao aparecimento da tipografia e nesse sentido recua a alguns milênios, quando pensamentos e factos começaram a ser registrados por meio de ideogramas e signos fonéticos. Esses registros foram feitos com os mais variados instrumentos e sobre diferentes suportes. Os desenhos das letras produzidos por culturas e povos distintos continuam a ser estudados, recriados e reaproveitados como matéria-prima para o design tipográfico.

Outro factor a ser destacado tem a ver com os projetos de novas fontes tipográficas, que apontam, fundamentalmente, em duas direções: para o passado, com o resgate ou releitura de antigas formas, e para o presente / futuro, onde experiências visam a ruptura, um percurso ligado, obviamente, ao fácil acesso à tecnologia, que nos abre inúmeras possibilidades, impensáveis sem o uso de tais ferramentas.

Ao direcionar o objectivo da comunicação escrita para a transmissão fluente de idéias, o texto deve observar padrões de legibilidade adequados ao olho humano. A esses parâmetros de linearidade e conforto de leitura, culturalmente estabelecidos durante séculos, contrapõem-se experiências mais ou menos radicais nos campos editorial e publicitário e nos domínios do web design. Deste forma a leitura pode ser dividida em dois momentos: primeiro ocorre a identificação visual da mensagem, com toda a sua idiossincrasia gráfica. Logo após, se houver empatia por parte do leitor, este percorrerá o texto, independentemente dos excessos e ruídos na comunicação.

Desde o início desta arte, a tipografia estabeleceu relações que, além dos aspectos estéticos e econômicos, valorizaram, fundamentalmente, as questões técnicas. Por exemplo, no século XVIII o design tipográfico impulsionou a evolução da técnica de impressão. Os responsáveis pelo desenvolvimento dos tipos procuravam a melhor reprodução do seu trabalho e os tipos com grande contraste entre as hastes dos caracteres, com traços muito finos, só puderam ser utilizados com o aprimoramento dos sistemas de impressão e da produção de papéis e tintas adequados. Não é por acaso que a profissão de tipógrafo, no século XIX, fosse das mais consideradas. O tipógrafo era o operário que ascendia à classe culta e socialmente valorizada dos jornalistas e intelectuais.
Em certas épocas ocorreram mudanças significativas, tais como o surgimento de novas técnicas, novas tecnologias, com sistemas de produção e reprodução mais ou menos revolucionários.
Mas voltemos um pouco atrás. A origem dos alfabetos actuais (sistemas de signos abstractos que representam a articulação de sons) remonta à antiguidade, com o uso de signos e símbolos para representar elementos naturais e actividades quotidianas.
O primeiro pictograma (desenho representando um objecto ou uma idéia sem que a fonetização de tal objecto ou idéia seja tida em conta) de que temos conhecimento remonta ao ano 3.500 a.C., uma peça encontrada na cidade de Kish (Babilônia). Mais tarde, os sumérios desenvolveram ideogramas (símbolos com ideias associadas menos concretas), sistema que foi se desenvolvendo até dar lugar ao sistema cuneiforme sumério de escritura, baseado em sílabas que imitavam a linguagem falada. Um exemplo desta escritura é uma tábua encontrada em Ur, que descreve uma entrega de cevada e comida a um templo.


A evolução posterior deste sistema silábico deu lugar à escritura cuneiforme (2.800 a.C.), que utiliza o que podemos considerar como o primeiro alfabeto, cujas letras se imprimiam sobre argila usando uma alavanca. Desta época datam uma infinidade de tábuas que contêm textos econômicos, religiosos, poéticos, e legais, como o famoso código de Hammurabi, um dos documentos jurídicos mais antigos do mundo.
Por volta de 1.500 a.C. desenvolveram-se no Egipto três alfabetos (hieroglífico, hierático e demótico). Deles, o mais antiga era o hieroglífico (um misto de ideográfico e consonântico), baseado em 24 símbolos consoantes.
Os fenícios, povo de viajantes e comerciantes, adoptaram este alfabeto egípcio mil anos antes de Cristo, usando para escrever peles e tábuas enceradas, e também o transmitiram pelo mundo civilizado, de tal forma que pouco depois foi adoptado também pelos hebreus e os arameos, sofrendo com o tempo uma evolução própria em cada uma destas culturas. Adoptado também por etruscos e gregos, o alfabeto fenício acaba por passar destes aos romanos que no século, I já possuíam um alfabeto idêntico ao actual.
E foi o Império Romano decisivo no desenvolvimento do alfabeto ocidental, por criar um alfabeto formal realmente avançado, e por lhe dar a adequada difusão. A escrita é, como se sabe um instrumento de domínio e ninguém como os romanos o souberam usar. Toda a Europa romanizada adopta o alfabeto romano ou latino.
A escritura romana adopta três estilos fundamentais: Quadrata (maiúsculas quadradas romanas, originalmente cinzeladas em pedra), Rústica (versões menos formais e mais rápidas na execução) e Cursiva (modalidades de inclinação das maiúsculas).
Tendp como ponto de partida o modelo fenício, desenvolveu-se também, por volta do século IV d. C, o alfabeto árabe, formado por 28 consoantes e no qual, à semelhança dos alfabetos semíticos, se escreve sem vogais, da direita à esquerda.
No ocidente, o alfabeto romano foi evoluindo e, no século X, no mosteiro de St. Gall, na Suíça, nasce um novo tipo de letra comprimida e angulosa, a letra gótica, mais rápida de escrever e que aproveitava melhor o papel, factores importantes numa época em que a procura de manuscritos (em pergaminho ou em papel, a partir do ano 1100) crescia notavelmente.
A letra gótica espalhou-se por toda Europa, surgindo diferentes variantes (Textura, Littera Moderna, Littera Antiqua, Minúscula de Niccoli,, etc.).
Em 1450 produziu-se um dos factos mais importantes para o desenvolvimento da Tipografia e da cultura humana: Johann Gutenberg (1398 – 1468) inventa, simultaneamente, os caracteres móveis e a impressora. O primeiro texto ocidental impresso, a "Bíblia de 42 linhas" de Mazarino, surge em1456, da imprensa de Gutenberg.

O trabalho de impressão possibilitou o uso de novos tipos de letra. Em 1470 Nicolas Jenson grava o primeiro tipo em estilo romano, inspirando-se nas Quadratas romanas, em 1495 Francesco Griffo desenha o tipo conhecido como Bembo, em 1501 Francesco de Bolonia desenha para Aldo Manucio o primeiro tipo mecânico cursivo e em 1545 o impressor francês Claude Garamond cria uma fundição e começa a fundir um tipo mais informal que a letra romana trajana, baseado no traço da pena de ave. Desde então, uma infinidade de tipógrafos colaboram na criação de novas fontes, com destaque para Alberto Durero, Giambattista Bodoni, Fournier, Didot, Caslon, Baskerville, Bodoni e, já no século XX, Max Meidinger (criador da fonte Helvetica em 1957), Cooperplate e Novarese.
IMPRESSÃO
A Composição Manual: é o mais antigo sistema de composição tipográfica e foi o único até o final do século XIX. Está em uso até hoje, em pequenas gráficas, por todo o mundo. Na sua essência, é o mesmo que foi utilizado por Gutenberg na produção da Bíblia de 42 linhas, em 1455. Os tipos de metal, com caracteres em alto relevo e invertidos, isto é, ilegíveis, são organizados individualmente formando linhas de palavras. Depois de utilizados na impressão, os tipos são devolvidos a uma gaveta, reordenados para uso posterior.
Cada tipo é fundido a partir de uma matriz, com a imagem do caractere em baixo relevo. Essa matriz é formada a partir de outra matriz em alto relevo, chamada punção, esculpida manualmente.
A principal contribuição de Gutenberg foi a invenção do molde ajustável, possibilitando que a matriz com o desenho de uma letra fosse reproduzido milhares de vezes. Para isso, precisou de vários anos para aperfeiçoar um refinado sistema, que viria a fundir os seus tipos móveis.
Essa técnica difundiu-se pela Europa e eram os próprios impressores que produziam as suas matrizes e fundiam os tipos. No final do século XV a técnica tipográfica já estava caracterizada como um ofício.
Os tipos de metal são feitos a partir de matrizes específicas para cada corpo, com variações de desenho para diferentes tamanhos.
O Inglês John Baskerville (1706 – 1775) mudou o rumo da tipografia quebrando as regras e a tradição do sistema de impressão de sua época. Descontente com o resultado obtido na impressão de seus tipos, mudou o design das máquinas impressoras e produziu papel e tintas especialmente para garantir a qualidade na reprodução de textos. As suas idéias revolucionárias não foram muito bem vistas e o reconhecimento só veio após sua morte.

Composição a quente: em 1884, Otmar Mergenthaler produziu o primeiro sistema mecânico de composição e fundição de tipos, conhecido como Linotipo.
Esse equipamento era formado por um teclado, com as matrizes do tipo a ser utilizado e trazia uma fundidora ligada a esse sistema de digitação. Quando o operador pressionava uma tecla, a matriz do caractere correspondente era libertada, sucessivamente, até formar uma linha, na medida estipulada previamente. Essa linha era transportada mecanicamente para a fundidora, que fundia uma linha de cada vez.

Composição a frio: o primeiro equipamento a usar o processo fotográfico apareceu no mercado em 1947, mais foi na década de 60 que a composição a frio atingiu o seu máximo desenvolvimento. Em boa parte isso foi possível graças à evolução da impressão offset, que permitia reproduções com melhor definições e, consequentimente, maior qualidade final. Os sistemas de fotocomposição eram incrivelmente mais rápidos, comparados aos sistemas mecânicos. As matrizes traziam os caracteres em negativo, que eram projetados em suportes sensíveis à luz e processados fotograficamente.

Sistema Digital: aqui, os tipos deixaram de ser, definitivamente, objetos com propriedades físicas; passaram a ser seqüências digitalizadas em código binário, vistas num computador, ou descrições de curvas vectoriais interpretadas por uma impressora.
Conclui-se que o progresso cultural da humanidade ocorre em ciclos, com mudanças nos eixos de poder e de conhecimento. Como se percebe, a história da tipografia reflete os movimentos de mudança (as revoluções) e, como outras artes e actividades, esteve quase sempre condicionada a factores de mercado. Os copistas da Idade Média pertenciam ao clero, e a produção de livros manuscritos era determinada pelos seus membros. Com a ascensão da burguesia, novos valores se levantam e o interesse pela informação fez aparecer um crescente mercado produtor e consumidor. Até hoje.

sábado, 19 de março de 2011

EU QUERIA QUE O MUNDO FOSSE ASSIM

Desenhos que retratam a magia do mundo, feitos de linhas, pontos, curvas e sorrisos.




Em cima: linhas, cores, direcção, mancha.... Um desenho a que o Daniel (3 anos) pôs o título de festa!

Ao lado: linhas e cores, proporções e um passeio com familiares.

Em cima: Pontos e linhas, quadrados, triângulos, círculos, cores. A casa, o carro, as flores e a chuva.

Ao lado: Uma árvore de Natal do tamanho da casa, um candeeiro ligado, porque é inverno. O mundo feito com um olhar descomplicado.

 Em cima: "Deve ser uma grande tempestedade", é o nome deste desenho, em que a casa encolheu, os candeiros balançam a chuva parece agulhas e o céu ficou preto.
Ao lado: Uma vaca, um cão e uma casa
E sempre triângulos, quadrados, pontos e o sol

 Em cima: Uma estação de tratamento de lixo, atrás uma lixeira que lança uma linha negra e incómoda de fumo. Ventoinhas voadoras e empregados sorridentes.

Ao lado: Um espectáculo de golfinhos, envolvidos pela água e pelas ondas. azuis apenas, claros escuros, em diferentes direcções e um golfinho saltitante.

 Em cima: o mundo de mãos-dadas, é apenas a família reunida no Natal. Todos contentes porque a estrela os protegia.

Ao lado: Uma casa parecida com a Casa da Música, diz o Daniel, porque as casas direitinhas são aborrecidas. A chuva são grossas gotas de água.

 Em cima: Nas férias fui ao Gerês e fiz grandes caminhadas.

Ao lado: O Outono é feito de castanho, texturas barulhentas e muitas folhas. Pedaços que sozinhos não são nada e juntos constroem um castanheiro da Índia.

Em cima: Um dia de Inverno com chuva, sol e flores. Pontos, pinceladas, traços e emoções.

Ao lado: O Michey, o Pateta e os sobrinhos. Cor em movimento.










PROPOSTA 1
CONCLUSÃO
Este trabalho foi feito em conjunto com o Carlos e enquanto eu procurava o invisível nos desenhos do Daniel ele encontrou-o em tudo o que nos rodeia. Pontos, linhas, cores, texturas, emoções. Quer as fotos dele (http://cecfdcv.blogspot.com/), quer os desenhos do meu filho, quando tinha 3/4 anos, mostram que o mundo é feito de elementos básicos e que nós apenas manipulamos, com maior ou menor sabedoria, esta matéria prima que tanto pode servir para nos deslumbrar ou horrorizar. Foi um exercício curioso, este, que o professor nos desafiou a realizar: olhar para o invísivel e ter a noção, de repente, que afinal o invísivel está representado em tudo de forma barulhenta.
Relativamente ao nosso quadrado e círculo, o que nos propusemos foi encaixar emoções tendo como ponto de partida dois contornos e alguns elementos básicos. A música que nos inspirou (Over The Rainbow) está intimamente ligado ao filme "O Feiticeiro de Oz" e à demanda de uma criança em busca da magia. É um tema que fala, obviamente, de esperança, de luz, de cor, de procura da harmonia tendo presente que depois da chuva, quando o sol brilha, o arco-íris aparece. É precisamente isso que nós quisemos expressar nas nossas imagens.

QUADRADO
Linhas que enquadram cores e tonalidades, mais frias em baixo, mais quentes em cima, a meio um arco-íris que começa a "derreter" porque a esperança superou o temor e o calor se espalha. Atrás do arco-íris, algures, o mundo procura o equilíbrio.

CÍRCULO

O arco-íris cobre toda a terra, o mundo é uma bola de cor, que pulsa de vida. A profundidade é o elemento mais marcante neste trabalho, juntamente com a cor. Enquanto que na imagem do quadrado procuramos criar uma narrativa linear, aqui (porque o círculo protege, unifica) pretendemos projectar movimento interno e externo.

QUADRADO E CÍRCULO
Quando o arco-íris se esvai, o céu fica mais iluminado. Paz, beleza, vida, transpiram do ambiente depois de uma tempestade. O mundo fica mais cheio, mais alto, maior.  A harmonia acontece quando há união, junção de formas e de emoções. Paz, beleza... magia.


  

quarta-feira, 16 de março de 2011

A arte de desenhar emoções

Linhas, pontos e manchas... Picasso e uma litografia extraordinária

Image of Lithograph by Pablo Picasso, Don Quijote and Sancho (164K)
Dom Quixote e Sancho Pança

QUADRADO E CÍRCULO

A linha delimita o contorno. De acordo com Dondis existem três contornos básicos: o quadrado, o círculo e o triângulo equilátero.
A proposta de trabalho que nos foi feita implica a utilização de dois destes contornos, o quadrado e o círculo.
A cada um dos contornos atribuem-se vários significados, uns por associação, outros por uma análise arbitrária e outros derivados das nossas percepções psicológicas e fisiológicas. Ao quadrado, refere Dondis, associam-se significados como honestidade, rectidão, cuidado; ao círculo infinidade e protecção. Mas o mais importante a reter é que todos os contornos são fundamentalmente figuras planas, simples e que podemos facilmente produzir. Na verdade, a partir dos três contornos básicos referidos, afirma Dondis, e mediante combinações e variações, obtemos todas as formas físicas da natureza e da imaginação humana. Incrível!

Tendo como ponto de partida esta ideia, vou postar, nos próximos dias, alguns desenhos do meu filho, quando tinha 3 e 4 anos, na sequência de um levantamento que fiz para a realização do trabalho proposto.
O desafio foi perceber a inevitabilidade e naturalidade dos elementos básicos, vísiveis de forma mais espontânea nos desenhos das crianças. Foram eles que serviram para me inspirar e trabalhar um quadrado e um círculo para comunicar sentimentos.

OLHAR O INVISÍVEL

Desenhar, pintar, garatujar, construir, esculpir, gesticular. Muitas acções que se resumem, na sua essência visual à utilização de uma lista básica de elementos. Independentemente dos materiais ou aplicações usadas (pedra, papel, madeira, etc., etc.) são os elementos da comunicação visual que constituem a essência do que olhamos e o seu número é relativamente reduzido: ponto, linha, contorno, direcção, tonalidade, cor, textura, dimensão, escala e movimento.
Poucos mas bons, estes elementos, porque são, verdadeiramente, a matéria prima de toda a informação visual. O que nós fazemos, ao criarmos uma obra, é tão somente eleger e combinar de forma selectiva os elementos básicos. O resultado pode ser um "Guernica" ou uma catedral, um "clip" ou um pedaço de arame.
Portanto a estrutura de um trabalho terá mais ou menos impacto de acordo com a escolha dos elementos básicos a utilizar, as combinações seleccionadas e o ênfase dado a cada um deles.
Grande parte do que sabemos sobre a interacção e o efeito da percepção humana relativamente ao significado visual deve-se, como percebemos na aula sobre a teoria da forma, aos estudos e experiências da psicologia Gestalt. A sua base teórica leva-nos a perceber que podemos analisar qualquer obra visual a partir de diferentes pontos de vista, sendo que um dos mais reveladores é aquele que consiste na decomposição da obra nos seus elementos constituintes para melhor compreendermos o conjunto. No fundo, podemos brincar com a obra destruturando-a para melhor a compreendermos. Salvo as devidas diferenças é como fazer a análise de um texto literário. Veja-se, por exemplo, esta frase retirada de um livro de Sophia de Mello Breyner Andressen (A Menina do Mar): " Sentia-se feliz, alegre e contente como um peixe". Uma frase simples, que nos transmite uma mensagem muito directa mas que utiliza uma série de recursos estilísticos (os nossos elementos básicos), como por exemplo a adjectivação (com o reforço da ideia), a comparação e simultaneamente a personificação. A beleza de um texto literário (e Sophia é mestre nesta área) encontra-se no ritmo das frases, conseguida através de recursos de estilo. Na comunicação visual os elementos básicos são as figuras de estilo. O grande artista, ou o grande comunicador, é aquele que consegue associar os diferentes elementos e comunicar, provocando sentimentos e emoções.
Utilizar os elementos visuais básicos como um meio para o conhecimento e compreensão quer de uma obra específica, quer do que nos rodeia (a cidade, a natureza, o mundo), é um excelente método para percebermos como aquilo que é visível muda (ao longo do tempo, acompanhando a história) mas o invísivel (o elemento na obra) está sempre presente. Por outro lado, percebemos também que dependendo do tipo de obra analisada predomina mais um ou outro elemento. Sabemos, por exemplo, que a ciência e a arte da perspectiva se desenvolveu extraordinariamente na ápoca do Renascimento, daí que as obras de arte daquela época tenham como característica a presença da noção de bidimensional, nomeadamente com a aplicação na perspectiva da técnica "trompe d'oeil" .
Tudo isto para dizer que os elementos básicos da comunicação visual estão presentes, abundantemente presentes, diga-se, à nossa volta, em tudo o que nos rodeia. E em todo o lado podemos perceber a harmonia (ou falta dela) da expressiva, sóbria e sensível linha; a riqueza visual do ponto (base constitutiva de qualquer imagem fotográfica analógica) e de todos os outros elementos.
A comunicação visual tem, obviamente uma linguagem, como se percebe, compreender a estrutura dessa linguagem não é mais do que olhar para cada um dos elementos e apreender as suas características específicas, vamos então tentar compreender melhor alguns dos mais importantes.
O PONTO
A unidade mais simples. Mínima. Na natureza o ponto é a formulação mais corrente (a recta é menos evidente). Uma pedra atirada a um lago vai dar origem a amplos pontos que são os círculos que se vão desenhando na água. Redonda ou curva é a natureza. Numa folha branca um ponto, colorido ou não. Um buraco ou uma mancha, é o que tem mais força visual... é para lá que os nossos olhos apontam.
Depois repare-se que dois pontos constituem uma ferramenta exacta para a medição do espaço, qualquer que seja o plano em que se trabalho (num estirador ou numa estrada). Em grande quantidade e sobrepostos os pontos dão-nos a ilusão de cor ou tonalidade (as manchas), veja-se a obra de Seurat e a sua exploração estética do fenómeno de fusão visual que muitos pontos provocam. A capacidade única que uma série de pontos possuem para guiar ou conduzir o olhar mais se intensifica quanto mais próximos os pontos estão uns dos outros.
A LINHA
Uma linha não é mais do que um enorme conjunto de pontos tão próximos que não se podem reconhecer individualmente. Na comunicação visual a linha assume um papel primordial, dando a sensação de energia de dinâmica e movimento. É fundamental para a liberdade criativa mas é também um elemento primordial da precisão (na arquitectura, por exemplo). Tanto pode servir como base para um trabalho que reflita flexibilidade e experimentalismo como é empregue como elemento de rigor. Mostra o invísivel, aquilo que está na cabeça do criador.
Por isso, a linha pode adoptar formas muito diferentes umas das outras, disciplinadas ou indisciplinadas, delicadas, finas, onduladas, agressivas, vacilantes ou indecisas. Tudo depende da obra que se quer registar. Um manuscrito é constituído por linhas, desenhamos imagens quando escrevemos à mão. A linha é isso mesmo, reflecte a mão e a alma de quem "escreve".


sábado, 12 de março de 2011

Pollock (2000) - pintura, música e movimento

SONATA AO LUAR DE BEETHOVEN

CONCERTO PARA VIOLINO DE BEETHOVEN

A DIFICULDADE EM PREENCHER ESPAÇOS

"Canção Excêntrica"

procura de espaço...

Ando à procura de espaço...
para o desenho da vida.
Em números embaraçados me embaraço
e perco sempre a medida...
Se penso encontrar saída,
em vez de abrir um compasso,
projeto-me num abraço
e gero uma despedida.
volta sobre passo..
Se volto sobre o meu passo,
é já distância perdida.
coração de aço!
Meu coração, coisa de aço,
começa a achar um cansaço,
por esta procura de espaço
para o desenho da vida.
Já por exausta e descrida
não me animo a um breve traço:
- saudosa do que não faço,
- do que faço, arrependida...

(Cecília Meireles)

sexta-feira, 11 de março de 2011

E UMA VERSÃO MUITO BONITA DE ERIC CLAPTON

UMA OUTRA VERSÃO

Judy Garland - Somewhere Over The Rainbow

10 ILUSÕES DE ÓPTICA

SIMPLES PARA SER FUNCIONAL OU FUNCIONAL PARA SER SIMPLES?

A teoria da forma e, sobretudo, uma das suas característica mais estudadas, pregnância, é uma velha conhecida do design. A idéia básica, ao que dizem os estudiosos, partiu dos filósofos Imanuel Kant, Wolfgang von Goethe e Ernst Mach, que em comum tinham a noção de que a percepção era um acto unitário. Com isto, eles queriam dizer que as pessoas não percebem as coisas aos pedaços; elas, melhor, o seu cérebro, organizam as informações de forma a dar um sentido ao conjunto. No início do século XX, psicólogos, curiosamente também eles alemães, reflectiram sobre esta idéia e criaram a denominada psicologia da Gestalt. Este termo alemão significa algo mais do que apenas a tradução da palavra, ou seja: "a integração das partes em oposição à soma do todo". Simplificando: se num grupo cada uma das pessoas ler apenas um verso de um poema terá uma experiência diferente da que retira da leitura do poema completo. Não é verdade?
Este intróito serve para tentarmos perceber o que esta teoria vinda da Psicologia trouxe à arte e ao design. E trouxe muito. Primeiro porque se fundamentou algo que a experiência já verificava, ou seja, que algumas formas agradam mais do que outras à generalidade das pessoas. Assim sendo, e partindo deste pressuposto elaboraram-se leis que, de alguma forma, regem a percepção visual e servem como guias de conduta a quem trabalha com comunicação visual. Essas leis são a unidade, a segregação, a unificação, o fechamento, a continuidade, a proximidade, a semelhança e, claro, a pregnância da forma. (do alemão Prägnanz) é a capacidade de perceber e reconhecer formas. Se a forma é complicada, e se ainda por cima estiver no meio de uma composição cheia de elementos gráficos e imagens, vai ser muito difícil apreendê-la e identificá-la. Será, então, uma forma com baixa pregnância.
Porém, se a forma for simples,se não tiver que disputar a atenção com outros elementos, teremos um a obra com alta pregnância. Dá para perceber que a pregnância tanto se pode referir à forma como ao contexto em que ela está inserida. Dito isto, ficamos com a ideia de que quanto mais simples melhor. Aliás, uma das máximas do Design é esta: "menos é mais". Contudo, como tudo na vida, as coisas não são tão lineares como esta frase parece indicar. Um estudioso destas questões, Jorge Frescara, na obra "Diseño gráfico y comunicación" (2000), defende um ponto de vista que é o oposto do referido.
Para contextualizar o pensamento deste autor, é bom recordarmos que o mundo da comunicação visual na actualidade constitui um verdadeiro oceano de informações. Os profissionais da comunicação visual são os que melhor estão preparados para separar o importante do acessório, ou seja, de retirar o ruído e criar objectos que transmitam a mensagem de forma limpa e directa. Limpar e organizar foram pois palavras de ordem de alguns movimentos artistícos como o construtivismo, o De Stijl e a Escola de Bauhans, apostados em retirar o excesso de ornamento (de informação) que popularizou muitos dos trabalhos gráficos do ínicio do século XX.
Precisamos, pois, de coerência, economia e simplicidade, afirmavam estes artistas, para atingirmos obras funcionais e belas. E é aqui que entra a teoria de Frescara, quando afirma, justamente, que a simplicidade está mais relacionada com a beleza do que propriamente com a funcionalidade. E vai mais longe, afirma que os designers, neste processo de simplificação, acabam por se enganar, visto que procuram obter a simplicidade em vez de encontrá-la como resultado da busca pela funcionalidade. Ou seja, "simplicidade" passou a ser o requisito de um projecto, em detrimento da funcionalidade. Assim, segundo este autor, "Simplicidade" passa a ser um estilo e já não apenas um critério.
Fica aqui o ponto de vista deste autor que, de alguma forma, nos obriga a reflectir sobre verdades tão consensais que não se questionam há muito tempo. Vale a pena dar uma vista de olhos pela obra de
FRASCARA, JORGE

DISEÑO GRAFICO Y COMUNICACION

Ano de Edição:2000

 BUENOS AIRES

 

domingo, 6 de março de 2011

A Teoria da Forma e o Papalagui

GESTALT OU TEORIA DA FORMA
DEFINIÇÃO:
Gestalt (do alemão) pode ser traduzida por forma, padrão, ou, de forma mais completa, pregnância da forma.
A Gestalt é uma teoria psicológica alemã sobre o fenómeno da percepção visual, que considera que determinados factores, como equilíbrio, clareza e harmonia das formas que vemos, contribuem para melhor estruturar essas imagens no nosso cérebro, por terem em conta padrões de organização desenvolvidos pelo sistema nervoso.
 

"O todo é maior que a soma das partes"
A frase que abre esta reflexão é, possivelmente, aquela que de imediato se associa à Gestalt ou Teoria da Forma, pelo menos se fizermos uma busca a partir do Google. Mas, mais importante do que encontrar formulações eruditas, o meu objectivo ao fazer esta pesquisa, na sequência do desafio do Professor Bruno Giesteira, foi tentar perceber até que ponto uma "teoria" que nasce no âmbito da psicologia, nos ajuda a olhar de forma diferente para aquilo que nos rodeia. Melhor, nos ajuda a organizar informação e a transformá-la em comunicação.
Curiosamente (ou não), ao ler sobre a Teoria da Forma veio-me de imediato à cabeça um livro que li há alguns anos. Chama-se Papalagui (que significa homem branco) e, embora o seu interesse esteja mais nas questões da antropologia, permite-nos, julgo eu, fazer uma excelente extrapolação para o tema que estamos a abordar. O livro é composto por uma série de discursos de um chefe indígena de Samoa que reflectem a sua percepção do mundo ocidental. O resultado é uma obra de um humor hilariante, mas que coloca questões profundas, questionando-nos sobre as nossas certezas. Mas, sobretudo, mostra-nos que aquilo que vemos, o que pensamos, está condicionado pelas nossas circunstâncias. O homem dito "civilizado", senhor da verdade, do conhecimento, da sabedoria é olhado pelo "bom selvagem", numa dimensão completamente diferente, porque diferentes são as circunstâncias e o peso dos valores cumulados por um e por outro. No fundo, o Papalagui obriga-nos a fazer perguntas como: o que é cultura? o que é civilização? o que é belo? o que é feio?
Na verdade, se estivermos atentos ao que nos rodeia, a nossa vida é feita destas interrogações. As nossas manifestações criativas são sempre resultado das nossas circunstâncias juntamente com o domínio maior ou menor das técnicas. Isto é verdade também, e sobretudo, tendo em conta a Teoria da Forma, na comunicação visual. Christian von Ehrenfels (1859-1932), psicólogo austríaco,lançou, em1890, as bases do que viria mais tarde a ser conhecido como estudos da Psicologia da Forma (Gestaltpsychologie). A sua primeira constatação foi a existência de duas espécies de "qualidades da forma": as sensíveis, próprias do objecto, e as formais,próprias da nossa concepção. O agrupamento das primeiras em sintonia com as últimas forma um conjunto e possibilita a percepção. A outra grande descoberta da Teoria da Gestalt, considerada por alguns estudiosos como a mais importante, foi a chamada "Lei da Pregnância", um conceito que Paul Guillaume sintetizou desta forma: "O sistema tende espontaneamente à estrutura mais equilibrada, mais homogênea, mais regular, mais simétrica". Assim, a pregnância da imagem diz respeito ao caminho natural que ela segue em direcção à boa forma, que é, idealmente, a mais simples de todas. E essa simplicidade é formada justamente por equilíbrio,homogeneidade, regularidade e simetria.
A Teoria da Gestalt, nas suas análises estruturais, descobriu certas leis que regem a percepção humana das formas, facilitando a compreensão das imagens e idéias. Essas leis reflectem conclusões sobre o comportamento natural do cérebro, quando age no processo de percepção. Os elementos constitutivos da imagem são agrupados de acordo com as características que possuem entre si, como semelhança, proximidade,entre outras. O facto do cérebro agir em concordância com os princípios da Gestalt já poderia ser considerado a evidência fundamental de que a Lei da Pregnância é verdadeira.


Fica aqui, um excerto do livro "O Papalagui, que eu gostaria de partilhar com todos.
E, já agora, chamar a atenção para o facto de que quando nós vermos um prédio com vários andares, numa rua de uma qualquer cidade europeia, não significa que um "indigena", vindo de uma ilha distante, não possa ver uma coisa semelhante a uma árvore, com ramos por onde se vai subindo, com buracos que nos introduzem em locais, que por sua vez têm outros buracos para outros espaços, abafados e mal cheirosos, onde vivem famílias.
Finalmente, e mais importante, parece-me, nenhuma das visões é falsa. diferentes sim, porque diferentes são as associações que o cérebro faz perante as formas e os conceitos que percepciona.
O Papalagui
Discursos de tuiavii, chefe de tribo de Tiavéa
nos Mares do Sul (Samoa)

Recolhidos por Erich Sheurmann (após a I Guerra Mundial) 
Das arcas de pedra, das gretas de pedra,
das ilhas de pedra e do que entre elas há

O Papalagui mora, como o mexilhão do mar, dentro duma concha dura. Vive entre pedras,
como a escolopendra entre as fendas da lava. Tem pedras a toda a volta, de lado e por cima. A sua cabana assemelha-se a um baú de pedra posto ao alto; um baú cheio de cubículos e de buracos. Entra-se e sai-se da concha de pedra por um só e mesmo sítio. O Papalagui chama a esse sítio «entrada» quando entra na cabana, e «saída» quando sai, muito embora uma e outra sejam exactamente o mesmo. Há um grande batente de madeira que temos que empurrar com toda a força antes de poder penetrar na cabana. Mas isso é só um começo: somos obrigados a empurrar mais uns quantos batentes e só depois é que ficamos realmente dentro da cabana.

A maior parte das cabanas é habitada por maior número de pessoas do que as que há numa só aldeia de Samoa. E preciso, por isso, saber-se exactamente o nome da aíga. Porque cada aíga ocupa a sua própria parte do baú de pedra, no cimo, em baixo ou a meio, à direita, à esquerda ou mesmo em frente. Além disso, na maior parte das vezes, uma aiga nada sabe da outra, mas mesmo nada, como se entre elas houvesse, não apenas uma parede de pedra, mas Manono, Apolima, Savaii Quando uma aíga mora lá em cima, junto ao telhado da cabana, temos que trepar em ziguezague ou à roda, através de vários ramos, antes de chegar ao sítio onde o nome da aíga estiver escrito na parede. Vemos então uma graciosa imitação de um mamilo de mulher, o qual devemos premer até soar um grito que fará vir a aíga. Esta, graças a um buraquinho redondo e gradeado aberto na parede, vê se não se trata de um inimigo. Só depois abre. Se reconhece um amigo, desprende logo um grande batente de madeira solidamente fechado a cadeado e puxa-o contra si, o que permite ao visitante entrar por essa fresta na cabana propriamente dita.
Esta é novamente cortada por inúmeras e rijas paredes de pedra e assim continuamos a insinuar-nos de batente em batente, a passar de um baú para outro baú cada vez mais pequeno. Cada baú – a que o Papalagui chama "sala" – possui um buraco através do qual entra a luz, e se for grande, dois ou mais buracos. Esses buracos são tapados com vidro, que se pode afastar para fazer entrar ar fresco nos baús, coisa assaz necessária. Há, no entanto, muitos baús sem buracos para o ar e para a luz. Um Samoano depressa sufocaria num baú assim, onde não passasse ar fresco, como acontece em todas as cabanas de Samoa. Além disso, os cheiros da cabana-cozinha também têm que sair. O ar que vem de fora não é, em geral, melhor; é quase incompreensível que um homem não morra em tal sítio, que o desejo de sair dali o não transforme em pássaro, que lhe não cresçam asas para poder tomar impulso e levantar voo, rumo ao ar livre e ao sol.
Pois, mesmo assim, o Papalagui gosta dos seus baús de pedra e não se apercebe de quanto eles são malsãos. Cada baú tem o seu fim próprio. O baú maior e mais claro destina-se às fonos
Enquanto isso, as raparigas e as mulheres preparam as refeições na cabana-cozinha, dão brilho às peles para os pés ou lavam os panos. Se os Papalaguis são ricos e podem dar-se ao luxo de ter criados, são estes que fazem tais trabalhos enquanto os Papalaguis vão fazer visitas ou procurar novas provisões de alimentos.
Há, na Europa, tantos homens a viverem deste modo quantas palmeiras há em Samoa, ou mesmo muitos mais. Alguns hão-de ter, por certo, um desejo ardente de ver a floresta, o sol e a luz; mas isso é geralmente tido por doença a precisar de remédio. Quando alguém se não mostra contente com aquela vida vivida no meio das pedras, dizem: «É um indivíduo desnaturado», o que quer dizer: ignora o que Deus destinou para o homem.
Esses baús de pedra encontram-se em grande número e muito próximos uns dos outros; nenhuma árvore, nenhum arbusto os separa; encontram-se ombro a ombro, como homens, e em cada um deles há tantos Papalaguis como numa aldeia de Samoa. Do outro lado, à distância de uma pedrada, encontra-se uma outra fila de baús, igualmente ombro a ombro e habitados por homens. Entre essas duas filas há uma estreita greta a que o Papalagui chama «rua». Essa greta é, às vezes, tão longa como um rio e coberta de pedras duras. Muito se tem que andar, primeiro que se encontre um sítio mais desafogado; mas é aí precisamente que vêm desembocar outras gretas. Têm o mesmo comprimento dos rios de água doce e as suas aberturas laterais são outras tantas gretas de pedra, semelhantes às demais. Pode-se assim deambular dias inteiros entre essas gretas antes de se dar com uma floresta ou um naco de céu azul. Nunca, no meio das gretas, se vê, na realidade, a cor do céu. É que em cada cabana há pelo menos um, e por vezes vários sítios, onde se faz fogo, e assim o ar está sempre cheio de fumo e de cinza, como acontece durante a erupção da grande cratera de Savaii. Esse ar insinuase pelas gretas, de modo que os baús de pedra mais altos parecem-se com os limos dos pântanos de mangrove, e os homens apanham com terra negra nos olhos e nos cabelos e com areia dura nos dentes. Mas isso não impede que os homens percorram as tais gretas desde manhã até à noite. Alguns sentem mesmo com isso um especial prazer. Em certas gretas reina a confusão: escoam-se os homens por elas como espessa vasa. São as ruas que comportam enormes caixas de vidro onde estão dispostas todas as coisas de que o Papalagui necessita para viver: panos, ornamentos para a cabeça, peles para os pés e para as mãos, provisões de comida, carne, alimentos a sério como sejam os frutos, os legumes, e muitas coisas mais. Tudo ali está para tentação dos homens. Mas ninguém tem o direito de tirar o que quer que seja, mesmo em caso de extrema necessidade; para isso é preciso ter recebido uma licença especial e feito uma oferenda. Nessas gretas, o perigo ameaça por todo o lado, pois não só os homens caminham em tropel, como circulam e galopam a cavalo em todas as direcções ou se fazem transportar em grandes baús de vidro que deslizam sobre rampas metálicas. O barulho é enorme. Fica-se surdo dos ouvidos, por via dos cascos dos cavalos e dos pés dos homens cobertos de peles duras, que ferem as pedras do chão. Há crianças a gritar, há homens a gritar de alegria ou de terror, grita toda a gente! Só aos gritos é que conseguimos fazer-nos ouvir. A barulheira é geral: são uns estalos, uns batuques, um estrondo tal, que mais parece a falésia de Savaii em dia de grande tempestade. Mas o bramido desta é mais agradável, não nos dá cabo dos sentidos, como o das gretas. Resumindo: baús de pedra com os seus muitos homens, fundas gretas de pedra correndo para um lado e para outro, quais mil e um rios, com seres humanos lá dentro, barulho e estrondo, poeira negra e fumo por toda a parte, árvore alguma no horizonte e nada de céu azul, nada de ar puro ou de nuvens – a isto chama o Papalagui uma «cidade», criação de que muito se orgulha; quando muitos há, que ali vivem, que nunca viram uma floresta, um céu lavado ou o Grande Espírito, face a face. Homens que vivem como os animais que rastejam nos pegos e se escondem sob os corais; e ainda estes estão rodeados pela límpida água do mar, e o sol ainda lhes chega com a sua cálida boca. Orgulhar-se-á o Papalagui desses calhaus que assim juntou? O Papalagui é um indivíduo de um bom senso algo singular. Faz imensas coisas sem sentido que o põem doente, e apesar disso gaba-se e vangloria-se delas.
A cidade é, pois, isto de que eu acabo de falar. Mas há muitas cidades, cidades pequenas e cidades grandes. As maiores são aquelas onde moram os chefes do lugar com postos mais elevados. As cidades encontram-se dispersas no meio das terras, como as nossas ilhas no meio do mar. A distância que as separa corresponde por vezes à que nós temos que percorrer para ir tomar banho ao mar, mas também, outras vezes, a um dia de caminho. Todas as ilhas de pedra estão ligadas entre si por caminhos já traçados. Mas pode-se igualmente viajar num barco terrestre, comprido e estreito como um verme, que cospe fumo sem parar e desliza com grande rapidez sobre uns fios de ferro, com mais rapidez do que uma canoa de doze lugares em plena corrida. Mas se apenas quisermos dizer talofa
Entre todas essas ilhas de pedra, estende-se a terra propriamente dita, chamada Europa. É uma terra em parte bonita e fértil, como a nossa. Tem árvores, rios e florestas e também aldeias verdadeiras. Embora as suas cabanas sejam igualmente de pedra, nem por isso deixam de estar, na maior parte das vezes, rodeadas de árvores carregadas de fruta; a chuva lava-as por todos os lados, e seca-as o vento.
Nessas aldeias moram homens dotados de natureza diferente da dos habitantes das gretas. Chamam-lhes homens do campo. Têm mãos mais rugosas e panos mais sujos que os homens das gretas, muito embora possuam muito mais de comer do que eles. A sua vida é muito mais bela e saudável do que a dos homens das gretas. Mas não é isso o que eles acham, e por isso invejam os outros a quem chamam mandriões, por eles não trabalharem na terra, nem enterrarem e desenterrarem frutos. São ambos inimigos, pois os homens do campo têm que alimentar os homens das gretas com o produto da sua terra, guardar, criar e engordar o gado e partilhá-lo com eles. De qualquer modo, custa-lhes sempre muito abastecer de alimentos os homens das gretas e nunca percebem realmente por que é que estes usam mais belos panos do que eles, têm mãos mais brancas e não são obrigados, como eles, a suar ao sol e a tiritar à chuva. Coisa que, de resto, preocupa muito pouco o homem das gretas. Este está persuadido de que tem direitos superiores aos do homem do campo e que aquilo que faz tem mais valor do que enterrar ou desenterrar frutos. Este conflito entre as duas partes não provoca contudo qualquer guerra entre elas. Quer viva entre gretas, quer viva no campo, o Papalagui acha que tudo está bem como está. Quando o homem do campo entra nas gretas, admira o poderio do homem que as habita, e este canta e arrulha sempre que atravessa as aldeias do homem do campo. O homem das gretas deixa o homem do campo engordar artificialmente os seus porcos, e este deixa o homem das gretas construir e gozar os seus baús de pedra.

Quanto a nós, filhos livres do sol e da luz, desejamos continuar fiéis ao Grande Espírito e não
sobrecarregar com pedras o seu coração. Só indivíduos desvairados e doentes, homens que largaram a mão de Deus, serão capazes de viver felizes entre gretas daquelas, sem sol, sem luz e sem vento. Reconheçamos a incontestável felicidade do Papalagui, frustremos as suas tentativas de construir, ao longo das nossas margens banhadas pelo sol, os seus baús de pedra, e de destruir a nossa alegria com pedras, gretas, sujidadebarulho, fumo e areia, como é desejo seu fazer.